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O governo de turno reacionário de Luís Montenegro (PSD), em coalizão com os demais partidos reacionários da Assembleia da República, apresentou o anteprojeto de lei laboral apelidado de “Trabalho XXI”. A ministra Maria do Rosário Palma Ramalho, responsável pela pasta do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social, juntamente com António Leitão Amaro, ministro da Presidência, assumem a linha da frente nesta ofensiva contra as massas trabalhadoras em Portugal.
A proposta mexe em mais de uma centena de artigos do já precarizado Código do Trabalho, revê diplomas complementares e serve-se ainda de diretivas da União Europeia para justificar a sua orientação. As palavras de ordem levantadas pelos reacionários para justificar o ataque aos direitos trabalhistas são as mesmas usadas até a exaustão em outros cantos do mundo que enfrentaram medidas semelhantes: “modernizar, flexibilizar, valorizar o mérito, dinamizar a economia”, omitindo a mais velha das intenções: tornar a mão de obra mais barata e as massas mais vulneráveis, reforçando o domínio do capital sobre quem vive da escravidão salarial.
Esta medida reacionária vem no momento de grande ataque aos direitos dos imigrantes e expansão avassaladora dos latifúndios, dando largos passos em direção a precarização geral da vida e queda drástica dos custos de mão de obra em Portugal, agindo contra todos os setores das massas exploradas e oprimidas enquanto busca alçar aos céus os lucros da grande burguesia e dos latifundiários.
Não há novidade aqui. Desde a crise financeira de 2008, potencializador da crise de decomposição final do imperialismo que se vive hoje no mundo, que Portugal se encontra numa posição de subordinação crescente às exigências do imperialismo, sobretudo alemão e francês. Sob o manto da União Europeia (hegemonizada por estas duas potências imperialistas em pugna, com a Alemanha sendo a hegemónica aí), da Comissão e do Banco Central Europeu, o país foi empurrado para políticas de austeridade, privatizações e cortes que fragilizaram os direitos democráticos das massas, conquistados por décadas de luta, suor e sangue. A promessa era sempre a mesma: “crescer” a economia para então avançar o bem-estar de todos. O que se consolidou, na verdade, foi uma economia submissa, assente em baixos salários, empregos frágeis e oportunidades rarefeitas para o proletariado. O “Trabalho XXI” nasce deste chão e serve-lhe de adubo.
O capital monopolista exige flexibilidade e encontra no velho Estado português o seu agente fiel. O Parlamento, composto exclusivamente pelo que se pode chamar de Partido Único da grande burguesia e do latifúndio, pode apresentar oscilações de forma, mas jamais de essência. Uns, como o PSD no Governo, carregam a bandeira da contrarreforma. Outros, como o PS, levantam críticas pontuais e defendem, apenas na superfície, o mínimo das políticas social-democratas, sem nunca fugir aos limites dos interesses das classes dominantes.
A falsa “esquerda” eleitoreira e oportunista, representada principalmente pelo “Partido Comunista Português” e pelo Bloco de “Esquerda”, denunciam com fraseologia revolucionária, mas sempre limitada ao espaço institucional onde sabem que são inofensivos para a velha ordem. A engrenagem política não se move ao sabor da vontade popular, mas dos interesses económicos que, em Portugal, passam pelo grande patronato nacional (representado pela grande burguesia) e sobretudo pelos interesses do imperialismo – vezes ianque, vezes alemão, vezes francês (sempre a depender de quem está a pagar melhor) – para quem a mão-de-obra portuguesa deve ser barata e dócil.
As medidas anunciadas falam por si: os contratos a termo e a termo incerto podem estender-se durante mais anos, eternizando a precariedade; o banco de horas individual regressa para permitir que o patrão decida, na prática sozinho, quando e como prolongar jornadas; a reintegração de trabalhadores despedidos ilicitamente deixa de ser garantida, substituída por indemnizações que transformam o direito em mercadoria e avançam a mercantilização geral da vida.
O direito à greve sofre nova limitação do velho Estado português, com serviços mínimos impostos a mais setores e percentagens definidas à medida do patronato, tornando a paralisação um gesto simbólico sem força real.
Até direitos do povo conquistados com décadas de luta, como licenças de parentalidade ou proteções em caso de luto gestacional, são postos em causa sob o pretexto da “modernização” económica. Tudo isto é apresentado como incentivo ao emprego jovem, como “estímulo à competitividade” e como “valorização do mérito”. Mas é de conhecimento geral que o mérito, no vocabulário do capital, significa apenas ser esmagado pelas políticas do imperialismo, que convulsiona-se em constantes crises e joga os operários em Portugal na miséria.
As classes dominantes procuram transformar o século XXI em réplica do século XIX. Com as novas tecnologias e a integração económica internacional, o imperialismo encontrou formas mais subtis de impor a velha exploração. Em vez de chicotes e correntes, são usados contratos temporários, metas de produtividade, algoritmos que vigiam cada minuto de trabalho. A precarização torna-se método para a grande burguesia, pois este acredita que manter os trabalhadores inseguros é a forma mais eficaz de preservar a submissão. É precisamente isto que o “Trabalho XXI” tenta institucionalizar.
É necessário compreender também o momento político em que surge esta proposta. O governo de turno à direita, com apoio da extrema-direita e da direita liberal, sabe que precisa de consolidar o seu poder através de uma marca de grande envergadura, e o “Trabalho XXI” é apresentado como essa contrarreforma de fundo. Mas há um risco oculto: enquanto as atenções se concentram neste pacote, outros projetos menores, mas igualmente nocivos, podem ser aprovados nas sombras, passando despercebidos ao olhar público. As massas trabalhadoras de Portugal devem manter-se vigilantes, porque os reacionários não atacam apenas por meio de grandes golpes, mas também por uma sucessão de pequenas medidas que, juntas, corroem os direitos conquistados.
O que está em causa não é apenas um conjunto de artigos no Código do Trabalho, mas o próprio modelo de sociedade em que se encontra Portugal nos dias atuais. Se aceitarmos o “Trabalho XXI”, abriremos caminho para uma regressão ainda maior do que a que vem sendo testemunhada nos últimos anos. O resultado será um proletariado cada vez mais explorado, sem tempo livre, sem estabilidade e sem futuro. E, como sempre, serão os mais jovens, os mais pobres, os imigrantes e as mulheres a pagar o preço mais alto.
Mas a história mostra que nada está decidido à partida. As massas já se mobilizam em lutas por todo o país, e cabe a cada operário, camponês e estudante perceber que esta não é uma luta dos outros, mas de si próprio. Só a mobilização, a organização e a luta consciente podem travar este retrocesso. É necessário informar, discutir nos locais de trabalho, criar comissões e estruturas que escapem ao controlo do patronato, apoiar as greves e manifestações e forçar a unidade das forças populares.
O novo pacote laboral não é mais do que uma medida reacionária para aprofundar a exploração das massas que vivem e trabalham em Portugal, uma tentativa de usurpar seus direitos, voz e dignidade. Somente com a organização, com o aprofundamento da linha revolucionária no seio do povo, com a radicalização da luta contra a crescente exploração é que as massas poderão ousar lutar e ousar vencer os ataques dos reacionários. Não se deve parar só por aí: nas lutas, os revolucionários devem aprofundar a luta ideológica pela assunção da tarefa estratégica atrasada do proletariado português, desenvolvendo progressivamente as demandas e reivindicações das massas em uma luta pelo Novo Poder político.
