Foto: Reprodução/Gerardo Santos
Neste dia 17 de outubro (sexta-feira), o parlamento do velho Estado português aprovou um projeto de lei que visa proibir o uso de roupas que ocultem o rosto, como a burca, em espaços públicos. Embora ainda dependa de sanção presidencial, a medida compõe uma série de ofensivas que toca ao âmago das mulheres do povo, migrantes e do movimento operário, popular e anti-imperialista, uma reação natural do velho Estado português a crescente crise geral do imperialismo que se alastra por todo o mundo em geral, e pela Europa em particular. A medida dracionana e ultrarreacionária avançou pela autoria de partidos como o Chega, CDS-Partido Popular, Iniciativa Liberal (IL) e Partido Social Democrata (PSD).
A medida contém em si um viés claro de preconceito religioso: proibir especificamente vestimentas que cubram o rosto implica discriminação contra práticas islâmicas. Tais leis tendem a atingir mulheres migrantes, descendentes de migração e todo o movimento popular pró-lutas de libertação nacional no Médio Oriente Ampliado, como a Resistência Nacional Palestiniana, que tem como símbolo o clássico keffieh usado pelos seus combatentes.
É comum que se use a narrativa da “libertação” feminina para justificar tais proibições, como se o velho Estado ou a jurisdição burguesa-feudal portuguesa pudessem impor por decreto “liberdade feminina”. Na realidade, o que surge aqui é uma clara tentativa de impor dois ataques às massas operárias e populares por parte do velho Estado: primeiro, o incitamento chauvinista da divisão entre massas, de forma a conquistar para si seus sectos mais atrasados e semear confusão e, segundo, golpear o movimento anti-imperialista em desenvolvimento no país, que vem a catapultar suas fileiras com força total após o Dilúvio de Al-Aqsa, a 7 de Outubro de 2023.
A onda reacionária que se alastra pela Europa
Este tipo de legislação reacionária não está a surgir só em Portugal. Em vários países da Europa há iniciativas ou leis que miram o uso do véu islâmico ou símbolos religiosos, categorias muitas vezes indistintas, sob pretextos de “neutralidade”, “segurança”, “laicidade” ou “preservação da identidade nacional”, uma forma de tentar criar um inimigo comum, o imigrante, desviando a atenção da real causa da crise geral que se torna cada vez mais aguda no continente europeu.
Em França, onde a burca e outras vestimentas que cubram o rosto são proibidas já há alguns anos, o velho Estado imperialista francês iniciou debates para aplicar restrições também ao hijab, abayas, etc. O mesmo se aplica para a Suíça, Dinamarca, Áustria e Países Baixos, que adotaram medidas semelhantes nos últimos anos e agora caminham em direção à proibição cada vez mais geral de vestimentas ligadas às massas oprimidas do Terceiro Mundo.
O discurso de partidos e grupos de extrema-direita ou nacionalistas tem usado a “ameaça cultural” ou “ameaça islâmica” para mobilizar medo e semear o chauvinismo nas massas populares, justificando leis que restringem liberdades democráticas dos diversos povos que migram para os países imperialistas e demais semicolónias na Europa por conta da exploração e saque de sua terra natal. Os migrantes são usados como bucha de canhão para, progressivamente, as classes dominantes reacionárias passarem a golpear todas as massas operárias e populares em geral, com maior intensidade em uns e outros sectores destas.
O oportunismo da falsa “esquerda” em geral (PS, “PCP”, PCTP/MRPP, BE, Livre, etc.), disparando-se como “vermelho” e “de luta” em forma, contenta-se com a existência inútil de grupos parlamentares que, na prática, sequer barram esse tipo de montão colossal de lixo, servindo apenas a contribuir para a fortificação da velha Assembleia da República reacionária. Afinal, que benefícios tiram o povo de todas essas movimentações?
Essa onda reacionária, em parte, está ligada à crise geral de decomposição do imperialismo, que desesperam os imperialistas e sua criadaria nos países oprimidos e os jogam a lançar toda sorte de repressão às massas, pois visam a todo custo barrar o desenvolvimento do movimento revolucionário, operário, popular e anti-imperialista. Sob o pretexto de preservarem a cultura e a “liberdade da mulher” no ocidente (liberdade esta que se resume a receber salários exponencialmente menores no ambiente de trabalho e responsabilizar-se integralmente pela manutenção do lar e criação dos filhos) estabelecem o inimigo como o imigrante, o estrangeiro, o muçulmano, o cigano ou qualquer outra minoria nacional, social ou religiosa que convenha para o momento.
Isto não tem outro fim senão a mistificação da realidade através do chauvinismo, mascarando para as massas populares quem são seus reais inimigos, os reais causadores de toda a crise política, económica, militar e cultural, tendo como objetivo dividir as massas e criar rachas em seu seio através da confusão geral.

A islamofobia a serviço do imperialismo
A islamofobia, principal preconceito da vez, sustenta leis como a proibição da burca e liga-se intimamente ao imperialismo, especialmente no contexto das lutas de libertação do Médio Oriente, que cada vez mais repercutem na Europa e fortificam um vigoroso movimento anti-imperialista. O tratamento dado às mulheres muçulmanas muitas vezes espelha os discursos de deslegitimação usados para justificar a ocupação, bombardeios ou intervenções sobre o povo palestiniano ou de outras regiões próximas, enquanto busca rebaixar estes povos perante as massas, tratando seus costumes como bárbaros, atrasados e opressivos.
Em Portugal, por exemplo, movimentos sólidos de solidariedade com a Palestina continuam a alertar para como a repressão a muçulmanos em solo europeu não é aparte da guerra de rapina imperialista às nações oprimidas. Lançam relatórios e organizam acções para denunciar o caráter colonial e de limpeza étnica no Médio Oriente.
Há uma ligação entre a opressão feminina e o chauvinismo: quem acusa os povos das nações oprimidas de “falta de civilização”, “atraso”, “opressão interna”, está muitas vezes a ecoar justificações usadas pelo imperialismo para pilhar nações inteiras, como o ocorrido na ocupação ianque no Iraque em 2003, no Afeganistão em 2001, na Venezuela no presente momento e na Palestina, onde seu criado sionista comete todo tipo de desgraças há mais de 70 anos.
A origem e a bagagem histórica da opressão feminina
Para entender por que a opressão feminina mantém-se tão intensa na sociedade atual, precisamos relacioná-la a como funciona o capitalismo e seu estágio superior (o imperialismo), e sobretudo os países semi-coloniais e semi-feudais.
A mercantilização constante de todos os aspectos da vida é regra no atual modelo de sociedade. A mulher, sobretudo, é largamente vista não como sujeito, mas como reprodutora, cuidadora, ou como objeto de consumo, e mesmo que tenha alcançado certo grau de igualdade ao homem dentro do direito burguês (principalmente por conta das lutas populares dirigidas pelas comunistas e revolucionárias), isto não tem aplicação prática total. O controlo reacionário sobre suas vidas em geral é também controlo sobre o seu corpo e a sua autonomia. Nos países semicoloniais e semifeudais, para além da opressão burguesa há a sobre-existência do vilipêndio da velha cultura pré-capitalista, semifeudal.
A emancipação da mulher só é plena quando ela participa ativamente na produção industrial e na vida coletiva, sem distinções de classe, nação ou origem religiosa, onde todo o trabalho doméstico mesquinho é coletivizado em uma grande indústria social com participação social integral. As mais avançadas organizações democráticas e revolucionárias insistem que a opressão feminina só será superada com a destruição das bases do sistema que sustentam o imperialismo.
Criminalizar o uso de vestes ou impor sanções legais às pessoas que as usem é empurrar ainda mais para a precarização da vida dessas massas, para a marginalidade, muitas vezes privando-as de acesso ao espaço público, ao trabalho ou simplesmente de sair de casa com segurança. Além disso, abre precedentes legais de que o velho Estado tem poder de impor restrições às liberdades democráticas dessas massas populares. A verdadeira emancipação não surge por decreto, muito menos por vias da repressão reacionária contra ela.
Contra a repressão chauvinista às mulheres migrantes, do povo, e ao movimento anti-imperialista, a luta
Para as massas operárias e populares, migrantes ou não, tal cerceamento de liberdades democráticas não é algo abstrato, mas que está na ordem do dia. Para além de uma repressão chauvinista aos migrantes, particularmente muçulmanos e mulheres deste sector das massas, relegando-os às piores condições gerais de vida e trabalho, o velho Estado português visa conter a explosividade visível do movimento anti-imperialista português, que cresce à medida que as lutas de libertação nacional – vide a Resistência Nacional Palestina – solapam e golpeiam o imperialismo e seus lacaios locais, como o sionismo e as monarquias árabes, que cada vez mais vendem seus povos ao saque imperialista, principalmente ianque.
As classes dominantes portuguesas, a grande burguesia e o latifúndio, querem impor o preço da crise de decomposição do imperialismo nas costas das massas populares, e o faz de cada vez, visando conjurar o perigo de explosão das lutas em todo o país; se atacarem todas as massas populares de uma vez só com extrema violência, verão o movimento operário e popular crescer de forma substancial a conter tal movimento. Se engana quem crê que a proibição da burca e demais vestimentas são um golpe somente nesse sector feminino e minoritário nacional das massas populares (o que já é ruim o bastante): ele é um golpe em todas as massas populares, que terão cada vez mais direitos democráticos, conquistados através de muito suor e sangue derramados, cortados.
Cabe, portanto, mobilizar, politizar e organizar as massas mais fundas e profundas do nosso povo para os combates que virão, visando a elevação da organização em um núcleo sólido de revolucionários que, em meio às lutas, conformarão o centro da briga pela unificação em torno da necessidade de reconstituir o Estado-maior do proletariado em Portugal. Mediante todo este processo e a atingir tal objetivo, se livrará a tarefa a todos os revolucionários, democratas e anti-imperialistas consequentes de robustecer e elevar a capacidade de luta do movimento operário e popular, se fundindo a este e às massas populares que o integram, forjando uma unidade em torno de princípios corretos, do classismo, da independência frente às forças reacionárias e oportunistas-eleitoreiras e da combatividade.
